quarta-feira, maio 31, 2006

1.

era vidro
que ficava na janela a observar os movimentos
o pêndulo do sol
a inconstância da lua
o vaievemevaievemevaievaie vão todos
para todos os lados
no de fora e no de dentro
menos quando a cortina era fechada

era vidro
até que uma pedra tocou
virou cacos, mas fingou apenas ter trincado

era vidro
apenas

pena
era vidro


pena
era apenas

sexta-feira, maio 26, 2006

1.

amor amoral
que prefere ser pedra em coma
do que ser flor morta

e não demonstra a trama que traça
enquanto a traça destrói os lencóis da cama
e que transforma marasmo
em milhares de cacos num vitral
trancado num quarto
a olhar e olhar e olhar

quarta-feira, maio 24, 2006

o balão

Ele insiste em desafiar a gravidade
Dançando como se fosse um bêbado
Sobe
Sem se sustentar em nada
Deixando pra trás o fio que o prendia
Nas mãos silenciosas de alguém que nunca foi seu dono

terça-feira, maio 23, 2006

MANIFESTO


A chinelagem era o momento festivo dos alunos da fabico. Alguns diziam happy hour, festinha. Tanto faz. A origem ninguém sabe - quando chegamos já estava ai – mas sabemos que era tradicional. Certas coisas já nascem tradicionais. Assim que saiam da aula o povo se reunia ali no dacom e no saguão pra dar uma descontraída, tomar um breja barata, bater um papo, dar uma chacoalhada e coisas do gênero. Tudo acontecia ali pelo térreo, sem maiores problemas. O diretório juntava uns pilas com a venda do trago, não alterava muito o cotidiano do prédio já que terminava cedo e o pessoal se divertia: bom pra todo mundo. Agora não tem mais: a direção não permite. Porque? Reforma do prédio. Mas a chinelagem não era ali no térreo, onde, de reforma, só temos portas laranjas? Isso mesmo. NÃO ENTENDEU NADA? NEM NÓS.
E assim fez-se a chinelagem marginal. Fruto da vontade de várias pessoas no reestabelecimento do evento, a idéia do protesto surgiu repentinamente, sem comando, sem uma organização formal, sem um cabeça. Surgiu e tomou corpo. A idéia era fazer um protesto nos moldes da tal festinha, mostrando que dá pra reunir o povo por ali sem causar problemas pra ninguém. O plano era ficar ali pela frente do prédio, batendo papo e curtindo um som, que obviamente seria improvisado na hora. REUNIMOS ALGO EM TORNO DE 100 ALUNOS. O som atrapalhou uma aula e foi imediatamente cessado, com o devido pedido de desculpas. Sem alternativas os alunos acharam que poderiam ocupar o espaço que lhes é destinado na faculdade, o diretório, pra se reunir, dançar e seguir com o protesto-festivo. ESTAVAM ENGANADOS. A segurança tentou, inexplicavelmente, barrar o nosso acesso ao prédio às nove horas da noite. Argumentamos que não estávamos fazendo nada de mais, já que éramos alunos e o horário era de funcionamento da faculdade. Não houve jeito: ordens superiores. Seguramos a porta com o pé e entramos pacificamente. Gritamos, por alguns instantes, algumas palavras de ordem, como manda o manual do bom protesto, mas nada que se compare as torturantes sessões de impressão da gráfica. Quem viveu, sabe. Sonzinho ligado, a moçada pôs-se a bailar. Enquanto o pessoal curtia, uma comissão de alunos pediu pra falar com o diretor, que "não foi localizado". Uma pena. Resolvemos sair já que O CONTATO COM O DIRETOR FOI FRUSTADO. Os alunos que mais estavam afim de ver a volta do famoso regabofe fabicano e se disponibilizaram a estabelecer um diálogo com direção assinaram uma lista de presença do protesto e foram embora faceiros.
E o diálogo veio na forma de uma comissão que vai JULGAR os alunos que cometeram INFRAÇÕES, devidamente sacramentadas por uma certidão de ocorrência redigida pela segurança da faculdade sem a presença de alunos. Resumindo: o conselho da unidade usou como base a declaração de apenas uma das partes para decidir abrir um processo administrativo CONTRA OS ALUNOS que, pacificamente, protestavam contra uma atitude do diretor da fabico. Grande diálogo! Pois ouçam bem cambada; não se pode mais reclamar na fabico! E quem não gostar vai direto pro SOE!
A universidade é um local para fomentar o crescimento intelectual e cultural, definida pelo Artigo 2º do Estatuto da Instituição como "(...) expressão da sociedade democrática e pluricultural, inspirada nos ideais de liberdade, de respeito à diferença e de solidariedade (...)". Nós, alunos que apoiamos a realização das chinelagens na nossa ainda querida fabico, acreditamos que algumas idéias presentes nesse artigo do nosso estatuto não estão sendo devidamente respeitadas com o estabelecimento dessa comissão de forma tão abrupta e intransigente. Não temos a intenção de afrontar ou desrespeitar a direção ou os membros do conselho da unidade. Queremos, sim, o restabelecimento do diálogo franco, direto e amistoso com o diretório estudantil e com os alunos desta faculdade.

DCE, DACOM E ALUNOS

segunda-feira, maio 22, 2006

1,

cansado do aperto das asas
abro a porta
caio fora e procuro o movimento das penas
que se espalham no chão como eu esperava
trazendo o tropeço
que evito no doce da nuvem que me sustenta
enquanto, lento ainda,

mas, sim, enfim, tento

e levanto um vôo maior
um novo começo de novo
e me movo em devaneios

pulo junto com paula para
o alívio do precipício

fujo dessa jaula
sem mais um minuto de demora
que aqui já não é mais meu canto
não posso mais morar
nessa canção
que já não carrega mais o peso do meu quebrado pranto
ou meu encanto em cores indivisíveis

vago zonzo em busca de sons de sonhos
e me arrisco
numa terra arisca
e que traz riscos que corro em correr

quarta-feira, maio 10, 2006

1.

Sou sangue e sombra
Que, sem luz, não se projeta
E fica esquecido na escuridão

Sem carne e ossos
Apenas um susto sem rosto
Um sonho que se desfaz
Segundos antes do abrir os olhos


Sou o soco na boca do estômago
Sou todos os ruídos na noite de insônia
Sou o moço sem seu suspiro
Sou o sussurro sem o espasmo
Sou a foice

terça-feira, maio 02, 2006

sobretudo

nas pedras, nos dorsos, nos ventres
nas frestas, serestas
nas partes
nas calmarias
e nos mares revoltos
nos mal-amares e nos armar-amores
nos calar a carne
no beijo da foice
no reflexo da noite na água
nas portas e salas
nas janelas fechadas
em cada abertura
em cada entrada
no futuro e na espera
nos estragos
no que foi e no que era
nos muitos travesseiros
em cada novo amuleto
em cada pequena quimera
na química
nos lírios
nas margaridas
nos delírios da libído
nos alibis mal resolvidos
nos esquívocos dos exercícios sem resposta