sábado, outubro 29, 2005

6h da manhã

E cada lábio marcado pelo batom,
iludido pela lasciva luxúria do vermelho,
era, agora, manso.
E, entre o silêncio
e um sussurro de poesia exposta à fumaça
de vários maços de cigarro
engolidos pela ausência de um gosto,
ela sorriu.
E, em seus sonhos,
amou.




.por rodrigo.

quinta-feira, outubro 27, 2005

lago

Olhou no lago
Enquanto o sol fugia
E a lua chamava suas ninfas bailarinas
Para brincar sobre as águas
Cálidas e caladas do outono sem nuvens

Ele se viu
Submerso em seus sonhos
Tão espelho, que chorou



.por rodrigo.

terça-feira, outubro 25, 2005

saudades


A saudade existe!
Às vezes, disfarçada de lembrança
que passa solta pelo ar
Outras, olhos de criança
mirando o longe mais próximo

Quem sabe,
se viesse aos poucos,
conseguisse suportar.
Mas não.
Vem... assim... de todo...
Ocupa os espaços confusos,
carregada de sustos
e leve como a lágrima
que torna os sonhos opacos.

Meio que toma tudo para si
Meio que forma o mundo
num canto escuro de um quarto suburbano

Um mundo de imagens invertidas
Meio vidro,
meio nuvem de cigarro,
meio vestígios esquecidos,
meio chocolate meio amargo...

Meio mundo nos separa
dos abraços raros
e dos laços que juntos cuidamos de criar
.por rodrigo.

domingo, outubro 23, 2005

eu sei que vocês não vão ler o post abaixo deste

ele possui duas páginas e meia de word...
é muito para a internet...
mas é pouco para as amizades e bons livros

on the road

”Hup hup! Terminei de ler on the road, não é preciso fugir de casa pra viajar por ai. Também é uma boa história de amizade. Boa viagem. BJS”

Era isso que contrastava com o brilho meio amarelo da tela do celular enquanto eu catava uma posição que fosse a menos desconfortável possível para as próximas infinitas sete horas de noite nublada e faróis que passavam zunindo na van lotada que nos trazia de volta para casa depois de alguns dias de comidas esquizofrênicas e violões cansados alternados com noites de flertes sem resultados e eternos amores platônicos. Fora as cartas que caiam na mesa junto com os drinques que se erguiam aos céus, também discutíamos sobre o próximo livro a ser lido e o próximo texto a ser escrito enquanto a rede era disputada e as fotografias tentavam guardar mais que o que simplesmente se via. Nós víamos. Era, agora, eterno. Por isso, poderíamos voltar pra casa, para o nosso Porto que nos uniu mais Alegre.

”Hup hup! Terminei de ler on the road, não é preciso fugir de casa pra viajar por ai. Também é uma boa história de amizade. Boa viagem. BJS”

As letras negras cortaram com seu bip bip o leve debate em que me metera para a esquentar a mente que vagava entre o passado e as próximas possibilidades enquanto o vento, que entrava confuso pela janela e acariciava o pescoço, cortava os ânimos e nos contava que voltávamos. E elas, as letras, vinham dos dedos do mais surreal de nós todos. Aquele que sempre está perto com seu terno preto cobrindo a camiseta laranja e que não precisa de nada para pensar em peixes pratas cruzando entradas de prédios lunares. Aquele que não estava na estrada conosco, mas que cantou sob a luz do fogo e o calor da lua para as estrelas do mar que se acumulavam na beira da praia só pra ouvi-lo descer acordes menores no seu violão de nylon. O homem de franja tão pesada quanto a dos beatles.

”Hup hup! Terminei de ler on the road, não é preciso fugir de casa pra viajar por ai. Também é uma boa história de amizade. Boa viagem. BJS”

Se ele diz, tenho que ler este livro. E tem que ser o mais rápido possível. No mínimo, como um selo para este destino de irmãos sem sangue conjugado. Mas eu confio no gosto dele. Oh, sim, confio com todos meus sentidos aguçados para perceber melhor o que ele quis dizer.


E assim, a estrada continuava de asfalto, as nuvens continuavam de algodão-doce, as conversas continuavam de olhos-abertos e a saudade continuava ecoando sobre algo que não conseguimos encostar. A viagem prosseguia para a alegria dos que nos esperavam na chegada.


”Hup hup! Terminei de ler on the road, não é preciso fugir de casa pra viajar por ai. Também é uma boa história de amizade. Boa viagem. BJS”


Ele me emprestou o livro. Coube a mim apenas lê-lo. Mas, como todo bom amigo, eu continuava a trocar músicas e inventar planos novos que não seriam realizados e obviamente o livro ficou ao lado da cama sem ser aberto por mais tempo que deveria. E ele ficava me encarando e eu fiquei dizendo coisas como “sério, preciso dormir! Eu sou humano, você sabe... a gente faz isso...”. mas eu só dizia isso pra ele também não encher o saco e ficar quietinho ali na cabeceira, junto com os outros que eu já tinha convencido que as suas horas chegariam. O problema foi passar a fase sem conseguir abrir um livro. Depois, foi mais fácil, você sabe. Quando se abre a porteira, os bois passam e é difícil de fechá-la sem que todos tenham passado.

Assim, comecei a ler sobre as inúmeras viagens através da América do Norte que Jack Kerouac translucidamente respirava nas linhas que transcrevia. Dizem por ai que este livro é a bíblia dos beats. Bom, eu posso acreditar nisso, mesmo sem ter lido as outras obras deste movimento que movimentou o contra-fluxo da cultura no mundo desde o final dos sessenta.

O livro é rápido e suas frases grandes não são sentidas pelo ritmo alucinado em que elas são ditadas na sua orelha por Sal Paradise - protagonista e uma espécie de Kerouac ficcional. As notícias que vem antes de se ler o livro contam da tríade “sexo, drogas e rockandroll”, mas o bom e velho amigo que enviou a mensagem realmente decifrou o livro muito melhor.

Certamente, a amizade é o fator que cria a base sólida na qual o asfalto irá se deitar depois para acolher os caroneiros e suas roupas já tão desgastadas. O livro inaugura a verborragia misturada com onomatopéias (a base da literatura beat). Mas não é qualquer verborragia. É uma explosão de pensamentos que cruza os nervos e vai descendo até o estômago que escolhe as palavras e, assim, compõe as emoções. Emoções que acabam deslizando do livro direto pra os olhos do leitor. A narrativa é envolvente. Principalmente, por que a história da amizade é conduzida através do sentimento de liberdade e da angústia juvenil que não cansa nunca de buscar e buscar (muitas vezes sem saber O que se busca) em todos os cantos. Explorar o desconhecido e não se prender a paradigmas.

A experiência vale mais do que a sabedoria adquirida através apenas do “ouvi dizer”. E isso vale também para a experiência literária. Kerouac não teve medo de testar essa mistura, até então, inédita. E se deu bem. A linguagem informal e lisérgica em alguns momentos foi o instrumento necessário que conseguiu unir de uma forma sólida e indestrutível ao novo jeito de dizer as coisas... O jeito urbano da juventude que se preocupava mais em Descobrir do que no dia de amanhã.

Mas, como é um livro que trata sobre esse sentimento de experimentações e dessa ânsia do Descobrir, nada é mais justo que a constância da palavra “melancolia”. A Melancolia permeia toda a história e certamente é a palavra que mais aparece nas páginas do romance. Romance que não trata nada de forma romântica, mas que usa da realidade e dos seus altos e baixos para criar o sentimento de expectativa inerente nos dois personagens principais - que acaba por trazer junto a melancolia que sempre acompanha essa angústia de não conseguir ser/estar em tudo que se gostaria.

E não teria como Dean (personagem mais que principal da história e exemplo do modelo beat), sob esta perspectiva, não ser “o cara mais melancólico”. Os olhos sempre buscando as possibilidades e as impossibilidades pelas quais ele vai lutar e para as quais ele vai se entregar de forma completa no próximo instante sem um piscar de olhos sequer. Mas a mente sempre pensando e passando pelo passado. Como se cada momento de sua vida tivesse feito uma cicatriz na sua retina e ele não conseguisse deixar de estar constantemente olhando para a sua vida. E, por causa disso, precisasse tanto tentar tirar de dentro dele aquilo tudo. Tirar daquele jeito dele: cuspindo em palavras sua história.

E é por ai que caminha (ou melhor, pega carona) “On The Road”. Com as histórias alucinadas e verborrágicas de Dean sendo contadas através da lisergia de Sal. E você só consegue pensar em estar com amigos, numa viagem qualquer, e com mil destinos a se escolher...

.por rodrigo.

idéia de camiseta:

eu faço musculação...


... mas meu metabolismo é ruim

terça-feira, outubro 18, 2005

antes mesmo de acontecer, eu peço ...

Se meu passo apressado passar pelo seu pé descalço, desculpe...

Posso estar pensando sobre o próximo passo sem perceber os lados - ou até mesmo você...

Por mais absurdo que isso possa parecer...




.por rodrigo.

domingo, outubro 16, 2005

caminho...

No barro ralo da estrada
Vejo teus rastros
Confundindo minhas pegadas





.por rodrigo.

da série: sem títulos (ao menos por enquanto)

Nas mãos do meu amado
Morro e mato cada instante
Os muitos nãos amargos
Que caem inchados na frente dos sonhos
Disfarçados de medos calados com seus novos sapatos e gravatas distintas
Mesmo sendo velhos palhaços com seus dentes doídos e calças caídas
Mas eles acabam se dissolvendo em sins
Deixando apenas um rastro pro passado cuidar
Pois estou em ti
E tu estás em mim
E é assim que será



.por rodrigo.

terça-feira, outubro 11, 2005

voz

Os seus anos de juventude coincidiram com os anos 70. Por isso, não tenho mais o que falar. Por que todos fazem idéia do que aconteceu nos anos 70 e não é preciso apresentações. E as histórias dele, ele nunca me contou.





.por rodrigo.

Estou

com tantas palavras trancadas nos ombros curtos;
com tantas palavras engasgadas na garganta seca,
com tantas palavras presas nos dedos trêmulos,
com tantas palavras nubladas os olhos molhados,
com tantas palavras gritando no ouvido calado,
com tantas palavras tatuadas na pele cicatriz,
com tantas palavras apertando o peito opaco,

com tantas palavras insonsas no estômago ácido,
com tantas palavras pisando no pé plantado,

com tantas palavras amarradas nas mãos infantis,
com tantas palavras voando no cérebro nuvem,
com tantas palavras riscadas no rosto espelho da alma...

que nem sei o que dizer...




.por rodrigo.

segunda-feira, outubro 10, 2005

Carrego comigo:

Um mundo;
Um umbigo;
Dois ombros;
Alguns sentidos
E, no bolso, um infinito



.por rodrigo.

domingo, outubro 09, 2005

vísceras

De onde vem
a tonta vontade
que aponta pra todos
os lados;
e que não acaba
ou acalma,
apenas se move?




.por rodrigo.

Lemos Leminski

Razão de ser

Escrevo. E pronto.
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
E as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel,
Quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?


Paulo Leminski




Leminski, mentiroso...
ehehehehhehehe



.por rodrigo.

sexta-feira, outubro 07, 2005

longe

Vi, lá fora,
- e vi além da alma -
o reflexo da lua na água

E não consegui conter
a vontade de tocá-la

Mas a janela
continuava fechada
e não pude chegar na sacada
para vê-la com calma

Continuei na cama
deitado
com o livro nos braços

Com as cortinas abertas
a olhar sem demora
a lua que eu lia
no olho que não via
mas que vigia a memória






.por rodrigo.

quinta-feira, outubro 06, 2005

de volta aos textos longos

por que a tarde é linda e a janela está aberta para que eu possa vê-la.
queria ver teus olhos, também, mas é horáro comercial e precisamos de alimento para o corpo.

então, tento voltar aos textos longos para fechar o hiato que existe entre nós.





Culpado
Sou o cara mais ingrato da face da Terra. Ou, ao menos, é o que eu acredito ser – dentro desse meu muno umbiguesco. Bom, em último caso, sou um cara muito ingrato. Não tenho mais certeza se sou tão ingrato quanto tantos outros. De repente foi uma frase precipitada. Uma frase egoísta e egocêntrica.

Já que não sou muito, então quero ser ao menos isso. Ao menos o ingrato. Mas não sei nem se consigo ser isso. Bom, o fato é que não sou o cara mais grato que conheço. Então, sou ingrato.

Não consigo mais olhar nos olhos. Penso nas dívidas que tenho com vocês e que não conseguirei pagar. Penso em todo o amor que me deram. Assim, de graça. Sem ao menos que eu pedisse. Foram me dando. Como se isso tudo sobrasse de vocês e vocês (não tendo outro lugar pra colocar) foram empilhando e largando em cima de mim. E eu aceitei. No início, meio assim, como esmola. Mas depois, veio a necessidade de ter vocês por perto. E por isso, fui me afastando.

Credo. Como sou ingrato.

Agora, tenho tudo isso aqui dentro. E não posso ter menos. Assim, não consigo devolver-lhes o carinho e os abraços. Abaixo os olhos nas palavras e atravesso a rua quando cruzo com seus passos.

Não peço que entendam. Nem quero que entendam. Pois, se entenderem, é por que são como eu. E, isso, não quero acreditar. E não posso aceitar.

É culpa desse vácuo. Desse suicídio em vida - esses passos que dava rente a linha do desfiladeiro. Esse espaço inócuo no qual me vi entrando, mas que acabou entrando em mim e expulsando o pouco que tinha.

Não, não sou vítima. Sou, em verdade, meu próprio prisioneiro.

Vi o crime. Vislumbrei o pecado. Cometi a heresia. Sentei na cadeira do réu. Fui meu promotor e meu advogado. Estive em cada membro do júri que inventei e dei a sentença. Como juiz, fi-la cumprir. Como culpado, me submeti.

E, como culpado, sempre peco por implorar por humanidade. Sempre peco por roubar dos outros o que não tenho. Por dar um jeito de ter a dignidade que me foi tirada.

O problema é que ignoro quem a tirou. E me vejo inocente. E, como tal, pensando em esperanças.
.por rodrigo.

homesick

Cada nova letra que leio descreve quem sou
Agora vejo aonde estive
Mas não acho o livro que diz onde vou estar


Mas
Já que sou redundante
Sinto a inconstância ceder
E percebo o caminho cansado
Abrir mais uma vez
As suas portas mofadas
E
Eu
Que sou fraco e postiço
Sigo sem sequer indagar
Se quero
Ou espero
Ou desespero
Ou crio coragem
E encaro o subsolo
Que em há sem fim
Aqui dentro


.por rodrigo.

Sinto os segundos se somarem à minha pele

E percebo que não era saudade
Mas a ausência que pesava no corpo cansado

Vazio que estava
Hoje, ao menos isso, eu sei...



.por rodrigo.

domingo, outubro 02, 2005

sem sono

Domingo...
De noite...
Comigo, apenas um livro;
As palavras;
As estrelas que não caem, mas que me tocam;
As lembranças...


e, quem sabe, algumas vírgulas

.por rodrigo, blackbird.